(Publicado no Guia da Semana)
Alguma coisa acontece com a nossa música no rádio. E não é apenas quando cruzamos a Ipiranga com a Avenida São João. Seja qual for a esquina, a maioria das estações de FM denunciam a falta de qualidade no repertório.
Tem gente preferindo escutar A Hora do Brasil a ouvir a música do Brasil (tudo bem, exagerei, mas não vai demorar para isso acontecer). Salvo algumas exceções, música boa é raridade na programação. O que fazer? Desligue o rádio e ligue o computador.
No mundo virtual a coisa é bem diferente. Em meio a um sistema complexo de códigos binários, existe um eficiente sistema democrático. Você não é escravo da programação dos outros. Pelo contrário, torna-se proprietário da escolha do que deseja ouvir.
E se fuçar, acha coisa boa.
Tem a Débora Gurgel tocando Só Danço Samba com o Nelson Ayres. Sabe quando você vai ouvir isso no rádio?
Puxe uma cadeira.
Tem a Silvia Goes despejando musicalidade em O Filho Que Quero Ter, do Toquinho e Vinícius. Por falar em Vinícius, tem o Calderoni, jovem compositor que merece um lugar nos seus ouvidos. (Nas rádios também, mas fazer o quê?) Tem outro Vinícius, chamado Dorim, soprando virtuosidade no sax, Chico Pinheiro anunciando uma nova fase da MPB, Ulisses Rocha com seu violão preciso, Thiago Espírito Santo e por aí vai.
A Internet devolveu o "sorriso no rosto de nossos ouvidos". E você não precisa saber o nome de todas as feras para capturá-las. O MySpace de um deles já é suficiente para chegar até os outros. Músico bom é tão raro que acaba virando uma panelinha. E que som faz essa panela.
Longe do autor aqui difamar um veículo tão importante como o rádio. Muito menos generalizar a falta de qualidade. Existem sim, algumas estações se esforçando para colocar música boa no ar. Mas são poucas. E a gente fica com uma sede imensa de som.
Quando vamos ouvir Notícias da Praça Central em alguma estação da FM? Ou o Hermeto tocando chaleira enquanto eu estiver no trânsito? A que horas o Morelenbaum vai dar uma entrevista sobre as suas influências musicais? Quando alguém vai dizer que o compositor de Duas Contas foi o Garoto e que ele fazia muito americano ir ao teatro só para ver seus arranjos nos shows da Carmen Miranda? E o Francis Hime, por onde ele anda cantando Embarcações?
Vamos lá, gente. Quero ver todo mundo cruzar os dedos, torcendo para que "som bom" seja uma rima possível nas rádios.